A espetacularização do processo penal midiático.

25 de agosto de 2023

É primordial demonstrarmos, antes de iniciarmos o texto, que o direito – diga-se de passagem, supremo – de defesa, por nós advogados criminalistas destinados aos clientes, é de fundamental importância ao Estado Democrático de Direito. Visando, sobretudo, a manutenção do contraditório, ampla defesa, do direito à imagem, da intimidade e, obviamente, do princípio basilar da dignidade da pessoa humana.


Diante de sua tamanha importância e pelo desrespeito corriqueiro necessário foi o nascimento de um importantíssimo instituto para obstar todas as violações a nós destinadas. O instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD). Tem como fulcral escopo o esclarecimento de que em nada se confunde a figura do profissional – advogado constituído – com a pessoa do ora indiciado, réu ou sentenciado, ou seja, pouco importa em qual momento processual esteja o causídico exercendo suas prerrogativas.


Poucos têm a noção da real necessidade e do indispensável papel do advogado criminalista no que tange à defesa técnica. O advogado não defende o crime, definitivamente não é essa a nossa atribuição. Nós defendemos a pessoa, defendemos o seu direito constitucional à defesa técnica, seu direito de ser processado, julgado e condenado nos termos da lei. Essa sim, caro leitor, é a nossa atribuição, para assegurarmos o devido processo legal.


Referenciando uma brilhante advogada criminalista e atual Presidente do IBCCRIM, qual seja: Eleonora Nacif (inclusive, já foi minha Professora de Recursos – Código de Processo Penal – na Escola Superior de Advocacia: ESA-SP): “em suma, temos de demonstrar à população que nós, advogados, defendemos o direito a ter direitos”. Você, leitor, deve estar se perguntando sobre o título: a espetacularização do processo penal pela mídia, certamente. Pois bem, darei alguns exemplos para que fiquemos sem quaisquer dúvidas nesse sentido.


A revista época em determinada edição publicou uma edição que a capa era um retrato do goleiro Bruno, e nela víamos estampada uma foto do goleiro com um título enorme dizendo: indefensável. Agora questiono-os: o repórter responsável pela capa estuda processo penal? Será que ele sabe quais são as defesas possíveis em um caso de competência do Júri? Acredito que ele não detinha tais conhecimentos, ao menos à época. Resumidamente, pois não é o tema do texto, citarei algumas teses defensivas que diferem do pedido de absolvição: podemos demonstrar que o agente agiu com sua vontade viciada pela inexigibilidade de conduta diversa, participação de menor importância, desclassificação, podemos retirar as qualificadoras para uma substancial diminuição de pena, coação moral irresistível, legítima defesa, etc. São, como leram, inúmeras. Entenderam o grande desserviço prestado pela revista com sua visão pequena de que temos como objetivo demonstrar se o agente é culpado ou inocente? Tudo é defensável, mesmo que a defesa não ataque a absolvição.


Vejam, há tempos a presente crítica atacando esse cenário midiático de total desinformação técnica em desfavor do réu é realizada, sobretudo quanto ao réu demonizado – quase que um alguém sem diretos – durante o trâmite do processo do tribunal do júri. Márcio Thomaz Bastos, meados do ano de 1.999, teceu a mesma crítica. Percebam: àquela época, não tínhamos ao nosso alcance toda a tecnologia hoje existente. Imagine, se naquele ano a mídia sensacionalista já era criticada pelo seu maléfico trabalho prestado, reflitam agora o tamanho do estrago que essa mesma impressa pode causar hoje com a era tecnológica. Existe uma grande curiosidade, por parte de nós humanos e curiosos que somos, acerca da tragédia do dia a dia, sobretudo quando envolve morte. O que ocorre é que os grandes veículos de comunicação notaram esse fascínio pelo sangue abrindo, consequentemente, grande parte de seus programas para esse tipo de atração. Eles precisam de lucro, são entidades empresarias que buscam ativos, e a rentabilidade desses veículos tem como origem a audiência, logo, como é de ciência nossa curiosidade sobre essa temática, serão amplamente e irresponsavelmente trabalhados. E para que: para lucrarem.


O Professor Doutor Sérgio Salomão Shecaira, Departamento de Direito Penal, Medicina Forense e Criminologia da Faculdade de Direito Universidade de São Paulo (USP), em um de seus inúmeros artigos acadêmicos publicados, nos elucida quanto o porquê dessa curiosidade atinente aos réus do Tribunal do Júri com o que segue: “um dos fatores que reforça esse fascínio das pessoas em relação à criminalidade é justamente porque quando nos diferenciamos do criminoso que não se deixa dúvidas quanto a condição de pessoas honestas que cada um atribui a si próprio”. Minha interpretação desse trecho é a seguinte: quando atribuímos a outrem más qualidades, quando os tachamos de criminosos, de monstros, muitas vezes não sabendo, sequer, o que realmente ocorreu, estamos nos diferenciando dessas pessoas. E por quê? Porque assim, podemos nos rotular como pessoas puras, diferentemente daqueles. Nos colocamos como pessoas sujeito de direitos e eles, infratores, como coisas, uma espécie que não detém direitos. Agora, antes de que me apontem como alguém que não respeita a informação, informação ofertada pelos veículos de comunicação, preciso afirmar: nada disso! É evidente que na sociedade atual, sociedade da informação, precisamos nos atualizar, todo santo dia. A informação é essencial. Todavia, o texto ataca a má informação, o excesso, tendo em vista que não podemos ser irresponsáveis a ponto de, por dinheiro, denegrir a imagem constitucionalmente tutelada de terceiros, mesmo que esse terceiro esteja no banco dos réus ou esteja indiciado pela autoridade policial. Todos, absolutamente todos, têm direito ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa.


Sobre o excesso alegado no parágrafo acima, explicarei agora o porquê. Simples, é diariamente divulgado, amplamente divulgado, pessoas e mais pessoas, casos e mais casos, de condenação, de indiciamento, de prisão flagrancial, etc. Agora, dito isso, faço a seguinte indagação: a mídia, todas elas, dá o mesmo espaço à defesa? Elas apontam com a mesma publicidade as pessoas que são inocentadas com sentença transitada em julgado? Elas dão, ao menos, a oportunidade de a defesa responder aos ataques sofridos? Preciso responder? Não, claro que não. Isso não vende, não traz lucro; falar bem deles não é rentável. Interessantíssimo que cada veículo tem sua “verdade” a ser publicada, cada emissora, cada jornal, cada site, traz sua identidade ao fato desvirtuando a verdade. A função social desses veículos é totalmente prejudicada, diariamente prejudica a defesa – como uma espécie de quarto poder – quanto ao trâmite processual. Resumindo, cada qual destes veículos criam a sua realidade. Nesse escopo temos, portanto, como fora exposto retro, a violação de alguns princípios, quais sejam: o devido processo legal, a ampla defesa, a plenitude de defesa nos casos do Tribunal do Júri (superior a própria ampla defesa), a presunção de inocência, a dignidade da pessoa humana, bem como as garantias constitucionais como o direito à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem.


A informação pelos meios de comunicação é quesito inequívoco de um Estado democrático de defesa, requisito basilar que, de tamanha importância, quando ocorre um Governo autoritário ou ditatorial, é a primeira ferramenta a ser removida. Ou seja, é fundamental a liberdade de imprensa, isso é inegável, não há qualquer dúvida nesse sentido. Tiremos como exemplo os vinte e um anos que nossa nação sofreu com a ditadura militar. Todos os veículos de comunicação à época sofreram, e muito, nesse ínterim. Com a redemocratização trazida com a carta política dos anos de 1.988, em seu artigo quinto, inciso IV a livre manifestação do pensamento sendo vedado o anonimato. E na mesma esteira, ainda no artigo quinto, inc. IX: é livre a expressão de atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente censura ou licença. Continuo, inciso XIV do mesmo dispositivo: e assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional.


A lei de número 13.188 de 11 de novembro de 2015 nos traz, para o auxílio nesse combate aos atos irresponsáveis dos meios de comunicação, nesses casos, que a retificação do mal causado deverá ter o mesmo espaço ou duração da violação contra aquela pessoa que tenha sido atingida pela propagação da informação maléfica. Exemplificando: fulano que for aviltado em determinado telejornal, o mesmo tempo utilizado para a agressão contra este terá de ser destinado em favor de sua defesa; cicrano que for sua honra atacada em determinado jornal impresso, o mesmo espaço utilizado nesse ataque deverá ser empregado no direito à resposta defensiva.


Como funcionaria: a pessoa que sofra a lesão encaminhará um comunicado via aviso de recebimento pedindo seu direito defensivo com o mesmo espaço ou tempo para que o exerça com paridade de armas. Nesse sentido, se em vinte e quatro horas seu pedido não seja cumprido extrajudicialmente, o pedido poderá ser destinado ao juiz que proferirá sua decisão em até dez dias, sob pena de multa.


Não podemos, conforme o exposto, alegar que seja caso de censura. Jamais podemos incorrer nesse erro, pois temos como fundamento o artigo quinto, inc. V da Constituição Federal que prevê o direito de defesa nos casos de lesão. Logo, trata-se de um direito fundamental no combate ao desrespeito à honra, à imagem, etc. Não podemos confundir a violência exercida pelos meios de comunicação com suporte no direito constitucional à liberdade de imprensa. Uma coisa é exercer o direito de exercer e propagar informações úteis e verdadeiras, outra coisa totalmente diversa é utilizar da força de propagação para ceifar a honra de outrem.


Preciso demonstrar, ratificando todo o exposto no presente texto, que mesmo nos casos em que o agente violado tenha direito à resposta, e que, ainda, seja indenizado, provavelmente o dano causado possa ser, facilmente, irreparável. Independentemente da quantia pecuniária destinada à indenização, o mau causado venha a se ternar irreparável diante da ampla lesão causada. Como exemplo, aos que não saibam, temos o caso da Escola Base que, injustamente e de forma devastadora, destruiu a imagem dos acusados de forma irremediável. (link do caso no site do canal ciências criminais: https://canalcienciascriminais.com.br/caso-escola-base/).


Notem: ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória, isto é, a presunção de inocência é direito de todos, acreditem, todos nós possuímos esse direito. Será que tal garantia é respeitada pela mídia? Vamos aos exemplos. Adoro exemplos!


Exemplo primeiro: capa da revista Veja, sobre o caso dos Nardoni, estampava um grande: “Foram eles”. Entretanto, essa afirmação foi exposta publicamente em 2008. Repito, eles alegaram à época que tinha sido o casal. Ocorre que o casal Nardoni foi julgado e condenado no ano de 2010. Em outras palavras, a sentença proferida pela justiça popular midiática, sem direito recursal, foi publicada anos antes da jurisdição competente proferir sua condenação.


Exemplo segundo: caso Carla Cepollina ré em um processo de competência do Tribunal do Júri acusada de ter matado o coronel Ubiratan Guimarães, em 2006 (responsável pelo massacre do Carandiru). O caso foi emblemático e amplamente divulgado pela mídia, obviamente, pois como é matéria que venderia facilmente o que traria, como consequência, lucro às empresas de comunicação envolvidas.


Ocorre que, antes de ser absolvida, trarei como exemplo os veículos impressos, a regra era ser assunto de capa com grandes e chamativas estampas. Entretanto, no dia seguinte à absolvição, a folha de São Paulo trouxe uma pequena nota de rodapé. Facilmente compreensível: absolvição não vende! Empresas visam lucro, resumidamente é isso: o rentável é veiculado e o não rentável é assunto secundário ou, ainda, descartável. Uma pergunta para reflexão acerca desse exemplo: caso ela, naquela oportunidade, fosse condenada, acham que o espaço do jornal (Folha de São Paulo) traria a notícia no rodapé da capa?


Após os exemplos trazidos à tona no parágrafo anterior, trarei à baila, agora, o artigo 11 (onze) da portaria 18/98 da Delegacia Geral de Polícia. Para a surpresa dos caros leitores e, na mesma oportunidade, hão de perceber que na prática dificilmente ocorre o que a portaria positiva. Segue abaixo:


“Artigo 11: as autoridades policiais e demais servidores zelarão pela preservação dos direitos à imagem, ao nome, à privacidade e à intimidade das pessoas submetidas à investigação policial, detidas em razão da prática de infração penal ou à sua disposição na condição de vítimas, em especial enquanto se encontrarem no recinto de repartições policiais, a fim de que a elas e a seus familiares não sejam causados prejuízos irreparáveis, decorrentes da exposição de imagem ou de divulgação liminar de circunstância objeto de apuração.


Parágrafo único: as pessoas referidas nesse artigo, após orientadas sobre seus direitos constitucionais, somente serão fotografadas, entrevistadas ou terão suas imagens por qualquer meio registradas, se expressamente o consentirem mediante manifestação explícita de vontade, por escrito ou por termo devidamente assinado, observando-se ainda as correlatas normas editadas pelo Juízos Corregedores da Polícia Judiciária das Comarcas”.


Isto é, os presos somente poderão ser fotografados ou filmados, entrevistados e expostos caso permitam de forma expressa e inequívoca. Será que o Datena, bem como o Luiz Bacci têm autorização ao filmarem e exporem ao público todos os presos suspeitos durante seus programas? Todas as mídias estão inclusas nessa indagação, utilizei-me, apenas, desses exemplos por entender os mais correlatos à indagação por utilizarem, diuturnamente, de prisões semelhantes aos filmes hollywoodianos para atraírem seu público, segurando-os para obterem audiência e, consequentemente, lucrando com o espetáculo. Trago-lhes outro exemplo, para concluirmos a presente crítica, do espetáculo em que a mídia faz em busca do dinheiro com um viés irresponsável, violento, irreparável e irrecorrível. O exemplo trata do caso sobre o homicídio cometido por Elize Matsunaga vitimando seu marido Marcos Matsunaga, herdeiro da Yoki. Para tanto, citarei, novamente, a Presidente do IBCCRIM Eleonora Nacif em um texto muito bem escrito e publicado pela Escola Superior de Advocacia:


“Elize Araújo Matsunaga é acusada de ter praticado homicídio triplamente qualificado (motivo torpe, recurso que impossibilitou a defesa da vítima e meio cruel) contra seu marido, o empresário Marcos Matsunaga, herdeiro da Yoki. Desde o dia 19 de maio de 2012, data em que ocorreram os fatos, as mídias em geral (jornais, revistas, televisão, rádio etc) têm se ocupado bastante em veicular notícias sobre este triste episódio. A edição de 13/06/12 da revista Veja, por exemplo, estampou uma foto na capa do belo rosto de Elize, lançando um legítimo “olhar 43”. A manchete que segue logo abaixo do “olhar” é a seguinte: “CASO YOKI – MULHER FATAL – A história de Elize Matsunaga, assassina confessa, que esquartejou o marido milionário enquanto a filha dormia”.


Interessante observar os elementos de impacto trazidos na capa da revista: 1) mulher fatal; 2) assassina confessa e 3) marido milionário. Em outras palavras, mulher bonita, crime e dinheiro. Para completar o mórbido menu, Elize era ex-prostituta, e conheceu Marcos através do site M. Class, no qual garotas de programa oferecem seus serviços. Notícias sobre o “caso Elize” e assemelhados causam grande interesse e curiosidade na população em geral. A imprensa percebe este interesse e acaba por destinar grande parte do tempo dos programas televisivos e das páginas dos jornais para veicular notícias sobre crimes. “Mulher bonita, crime e dinheiro” definitivamente, vende.”


Com muita elegância e técnica Eleonora Nacif, novamente, contribuiu conosco para entendermos o papel desempenhado pela mídia no processo penal, transformando-o em uma dramaturgia, de forma irresponsável, impossibilitando muitas vezes – quase sempre – o exercício do contraditório, da ampla defesa e dos possíveis recursos ante as suas, irreparáveis, condenações.



Encerramos, portanto, o texto demasiadamente crítico atinente às irresponsabilidades (reitero) cometidas pelos veículos de comunicação. Oportunamente reafirmo: minha crítica não é menosprezando ou diminuindo o fundamental papel da mídia. Muito pelo contrário, nos dias atuais precisamos de muita informação, isso é inquestionável! Todavia, precisamos nos ater ao ordenamento jurídico pátrio, sobretudo no que diz respeito aos preceitos constitucionais.


Por Daniel Diogo 25 de agosto de 2023
Antes de adentrarmos no tema especificamente, precisamos aclarar um ponto essencial, qual seja: os menores, assim como os absolutamente incapazes, são inimputáveis! Abordaremos, por obviedade, apenas os menores (criança e adolescente), tendo em vista que o intuito do artigo é a elucidação do ato infracional e suas consequências. A própria Constituição Federal positiva a inimputabilidade dos menores. Artigo 228, CF “São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial.”. No ordenamento jurídico brasileiro, encontramos a inimputabilidade no Código Penal, artigo 27 “Os menores de 18 (dezoito) anos são penalmente inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial.”. E claro, como fundamentação legal, ainda, temos o que consta do artigo 104 do Estatuto da Criança e do Adolescente: “são penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às medidas previstas nesta Lei.”. Logo, diante do acima descrito, percebemos que o menor não comete crime. Ocorre que, no exato momento em que essa criança ou esse adolescente comete uma conduta descrita como crime, na realidade, ele estará cometendo um ato infracional. Ato infracional é uma conduta descrita como crime, tendo como autor um menor. Exemplo: artigo 121, CP: matar alguém. Esse homicídio é cometido pelo menor, e esse ato é considerado ato infracional diante de sua condição de inimputabilidade. Exatamente como expressa o artigo 103 do Estatuto da Criança e do Adolescente: “considera-se ato infracional a conduta descrita como crime ou contravenção penal.”. Conforme exposto no título, para que discorramos sobre o trâmite do ato infracional, precisamos, primeiro, explicar a diferença entre criança e adolescente. Essa diferença é fundamental para falarmos sobre as consequências que a Lei nº 8.069/90 impõe a cada um desses personagens. Considera-se criança, para os efeitos do ECA, a pessoa até 12 (doze) anos de idade incompletos; já o adolescente é a pessoa entre 12 (doze) e 18 (dezoito) anos de idade. É o que consta expressamente no texto do artigo 2º dessa Lei. A regra para a aplicação das medidas socioeducativas é sua aplicabilidade aos menores de dezoito anos. Todavia, como toda regra comporta uma exceção, o parágrafo único do artigo segundo nos traz a seguinte exceção: “nos casos expressos em lei, aplica-se excepcionalmente este Estatuto às pessoas entre dezoito e vinte e um anos de idade.”. Isto é, tais medidas, caso impostas ao menor de dezoito anos, poderá perdurar até que o infrator complete 21 (vinte e um) anos. Esses casos são comuns na ocasião em que a ação é praticada pelo agente ainda menor, porém com seu aniversário de maioridade estando próximo. Ou seja, pelo fato de, ainda, ser inimputável e na data do cometimento da conduta ainda ostentava tal condição, esse agente responderá pelos ditames do ECA. Não importa se faltava, apenas, um único dia para atingir a sua imputabilidade, mesmo assim responderá pelo ato infracional e não pelo cometimento de um crime. Dá-se o nome, ao retrocitado, de teoria da atividade, artigo 4º do Código Penal. Necessário, ainda no que tange aos atos infracionais, falarmos sobre a criança e sua responsabilização pela conduta infratora. Sim, a criança comete ato infracional, é vista como sujeito ativo dessa conduta. No entanto, temos o que chamamos de irresponsabilidade penal, tendo em vista que às crianças não são aplicadas as medidas socioeducativas. As medidas socioeducativas, aduzidas no artigo 112, ECA, são restritas aos adolescentes. O que ocorrerá, então, se a criança for autora de um ato infracional? Simples, à criança é destinada as medidas protetivas, previstas no artigo 101 desse Codex. Isso é dizer: às crianças não são destinadas as mesmas medidas destinadas aos adolescentes. Segue, agora, as medidas de proteção cabíveis às crianças: Art. 101. (…) I – encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade; II – orientação, apoio e acompanhamento temporários; III – matrícula e freqüência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino fundamental; IV – inclusão em serviços e programas oficiais ou comunitários de proteção, apoio e promoção da família, da criança e do adolescente; V – requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial; VI – inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos; VII – acolhimento institucional; VIII – inclusão em programa de acolhimento familiar; IX – colocação em família substituta. Sem adentrarmos às minucias dessas medidas porque não é a pretensão do presente estudo. Tenho como objetivo abordar o procedimento utilizado pela Lei, sem aprofundamento, tão somente uma visão geral desse processamento. Importante, isso não podemos ignorar, é que o órgão competente para a aplicação de tais medidas à criança é o Conselho Tutelar. Haja vista, conforme retromencionado, que atos cometidos pela criança não são encaminhados ao Parquet, mas sim ao conselho Tutelar, reitero. Imperioso deixar claro que tais medidas devem ser aplicadas conforme a necessidade, principalmente no que diz respeito às necessidades pedagógicas. E sempre que possível, deverá ser preservado o vínculo familiar entre a criança e sua família. Por fim, caso a região não possua a instalação do Conselho Tutelar, a competência para a aplicação das medidas de proteção será da Autoridade Judiciária. Passamos pelos aspectos gerais da Lei sem, especificamente, tratarmos dos procedimentos em sede de Delegacia de Polícia, sem passarmos pelo Ministério Público e, obviamente, sem tratarmos sobre o Judiciário. Agora, suponhamos que o agente infrator – primeiramente a criança, depois trataremos do adolescente – fosse apreendido em flagrante pelo ato infracional e levado à Delegacia, qual seria o procedimento adotado? Essa criança seria encaminhada ao Conselho para que, este órgão, adotasse a modalidade de Medida de Proteção mais adequada ao caso concreto. Pronto! Tratamos o suficiente para que entendam o que ocorrerá com a criança infratora. Agora, falaremos sobre o adolescente infrator. Fase Policial. Assim que o adolescente é apreendido em situação flagrancial, o Delegado lavrará o auto de apreensão em flagrante. Neste auto serão ouvidos: condutor, testemunha e o adolescente. Até aqui, sempre igual. O que modificará será a espécie da conduta praticada. Podendo ser com ou sem emprego de violência. Auto de apreensão em flagrante será lavrado, sempre, não haverá discricionariedade, quando a ação for com emprego violência ou grave ameaça. Diferentemente do que ocorre nas hipóteses em que o menor for apreendido por crime sem violência ou grave ameaça. Nessas situações, o Delegado de Polícia terá a discricionariedade de: lavrar um auto de apreensão em flagrante ou, ainda, poderá confeccionar um boletim de ocorrência circunstanciado. Caberá a ele a decisão, pois, como a conduta é mais branda, poderá abrir mão de um procedimento complexo e utilizar um procedimento mais simples, sem oitiva de condutor e testemunha. Vide a transcrição legal do acima exposto: Art. 173. Em caso de flagrante de ato infracional cometido mediante violência ou grave ameaça a pessoa, a autoridade policial, sem prejuízo do disposto nos arts. 106, parágrafo único, e 107, deverá: I – lavrar auto de apreensão, ouvidos as testemunhas e o adolescente; II – apreender o produto e os instrumentos da infração; III – requisitar os exames ou perícias necessários à comprovação da materialidade e autoria da infração. E mais, havendo no local da apreensão Delegacia especializada, esse adolescente deverá ser encaminhado a ela para o seu devido atendimento. O Estatuto da Criança e do Adolescente adota como procedimento responsável pela investigação o Auto de Investigação de Ato Infracional. Trata-se do mesmo procedimento do Inquérito Policial, porém tem como objetivo a apuração de casos de ato infracional. Busca-se, com o Auto de Investigação de Ato Infracional, os indícios de autoria e materialidade para que o titular da Ação (Representação, o nome da peça, tal qual a Denúncia no Processo Penal) dê o devido prosseguimento. Assunto que será oportunamente elaborado. Existe no ECA uma espécie de prisão provisória., mas, como abordado nesse estudo, sabemos que o menor não é preso, e sim apreendido. Consequentemente, havendo uma premente necessidade, poderá ocorrer a denominada internação antes da sentença. A internação antes da sentença ou internação provisória, está positivada nos artigos 108 e 174 do Estatuto da Criança e do Adolescente. Vejamos: Art. 106. Nenhum adolescente será privado de sua liberdade senão em flagrante de ato infracional ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente. Art. 174. Comparecendo qualquer dos pais ou responsável, o adolescente será prontamente liberado pela autoridade policial, sob termo de compromisso e responsabilidade de sua apresentação ao representante do Ministério Público, no mesmo dia ou, sendo impossível, no primeiro dia útil imediato, exceto quando, pela gravidade do ato infracional e sua repercussão social, deva o adolescente permanecer sob internação para garantia de sua segurança pessoal ou manutenção da ordem pública. E mais, não poderá ultrapassar o prazo de 45 (quarenta e cinco) dias; e o prazo determinado pela Lei é improrrogável! Sua decretação deve ser observados os seguintes critérios, quais sejam: indícios de autoria e materialidade (fumus comissi delicti eo periculum libertatis); e a garantia da ordem pública ou garantia de sua segurança pessoal (periculum libertatis). Tão logo ocorra o término das investigações do ato infracional, a Autoridade Policial encaminhará os autos ao Ministério Público, e já sabemos, diga-se de passagem, que é o órgão titular da ação. Até aqui, passamos pelas atribuições da Polícia Judiciária. Adentraremos, agora, na segunda fase do procedimento, a fase Ministerial. Fase Ministerial. Neste momento as diligências na fase investigativa – processada no âmbito da Polícia Judiciária – já chegaram ao fim. Assim, tudo aquilo colhido será apresentado ao Ministério Público, juntamente com o adolescente infrator. Inicialmente o Ministério Público deve chamar o adolescente, na pessoa de seu representante legal, para uma oitiva. Serão ouvidos na mesma oportunidade: seus responsáveis, a vitima e a testemunha para melhor elucidação do caso. Importantíssimo destacar que o Órgão Ministerial deverá esgotar todos os meios possíveis e legais para que o adolescente infrator seja ouvido. Nesse sentido, assevera o artigo 179 do Estatuto da Criança e do Adolescente: Art. 179. Apresentado o adolescente, o representante do Ministério Público, no mesmo dia e à vista do auto de apreensão, boletim de ocorrência ou relatório policial, devidamente autuados pelo cartório judicial e com informação sobre os antecedentes do adolescente, procederá imediata e informalmente à sua oitiva e, em sendo possível, de seus pais ou responsável, vítima e testemunhas. Parágrafo único. Em caso de não apresentação, o representante do Ministério Público notificará os pais ou responsável para apresentação do adolescente, podendo requisitar o concurso das polícias civil e militar. O Promotor de Justiça que receber o caso terá as seguintes possibilidades após a oitiva: ele poderá arquivar, representar ou conceder a remissão. O arquivamento está positivado nos seguintes artigos: 180, inciso I combinado com o artigo 189 e 205 do Estatuto da Criança e do Adolescente. A saber: Art. 180. Adotadas as providências a que alude o artigo anterior, o representante do Ministério Público poderá: I – promover o arquivamento dos autos; Art. 189. A autoridade judiciária não aplicará qualquer medida, desde que reconheça na sentença: I – estar provada a inexistência do fato; II – não haver prova da existência do fato; III – não constituir o fato ato infracional; IV – não existir prova de ter o adolescente concorrido para o ato infracional. Parágrafo único. Na hipótese deste artigo, estando o adolescente internado, será imediatamente colocado em liberdade. Art. 205. As manifestações processuais do representante do Ministério Público deverão ser fundamentadas. Escolhendo, o parquet, pelo arquivamento, não poderá cumular tal instituto com a medida de proteção. Vedação devidamente tutelada pela inteligência do artigo 99. Art. 99. As medidas previstas neste Capítulo poderão ser aplicadas isolada ou cumulativamente, bem como substituídas a qualquer tempo. Promovido o arquivamento pelo Promotor de Justiça, o Magistrado pode homologar. Não homologando, o Juiz encaminhará ao Procurador Geral de Justiça para que a peça inicial acusatória (Representação – semelhante à Denúncia) seja ofertada. O PGJ poderá, também, entender que não seja caso para ofertar a Representação e ratificar o arquivamento do Promotor. Nesse último caso, o juiz estará obrigado a homologar o arquivamento. Temos, conforme aduz o ECA, a possibilidade de Representação. Efetuada a representação, o Juiz iniciará o processamento para aplicação da Medida Socioeducativa. Neste ínterim, poderá aplicar as medidas restritivas de liberdade, quais sejam, liberdade assistida ou/e internação. Art. 182. Se, por qualquer razão, o representante do Ministério Público não promover o arquivamento ou conceder a remissão, oferecerá representação à autoridade judiciária, propondo a instauração de procedimento para aplicação da medida sócio-educativa que se afigurar a mais adequada. § 1º A representação será oferecida por petição, que conterá o breve resumo dos fatos e a classificação do ato infracional e, quando necessário, o rol de testemunhas, podendo ser deduzida oralmente, em sessão diária instalada pela autoridade judiciária. § 2º A representação independe de prova pré-constituída da autoria e materialidade. Trata-se, a Representação, como a peça processual inicial, tal como a denúncia e queixa-crime, do Código de Processo Penal. Válido dizer, oportunamente, que a prova preconstituída é prescindível para a propositura da Representação. Por fim, vamos tratar brevemente sobre o instituto da Remissão na fase Ministerial. A Remissão encontra arrimo no artigo 180, inciso II, combinado com o artigo 126 e 127 do ECA. Art. 180. Adotadas as providências a que alude o artigo anterior, o representante do Ministério Público poderá: II – conceder a remissão Art. 126. Antes de iniciado o procedimento judicial para apuração de ato infracional, o representante do Ministério Público poderá conceder a remissão, como forma de exclusão do processo, atendendo às circunstâncias e consequências do fato, ao contexto social, bem como à personalidade do adolescente e sua maior ou menor participação no ato infracional. Parágrafo único. Iniciado o procedimento, a concessão da remissão pela autoridade judiciária importará na suspensão ou extinção do processo. Art. 127. A remissão não implica necessariamente o reconhecimento ou comprovação da responsabilidade, nem prevalece para efeito de antecedentes, podendo incluir eventualmente a aplicação de qualquer das medidas previstas em lei, exceto a colocação em regime de semiliberdade e a internação. Sua aplicação é permitida em dois momentos, quais sejam: pré processual e processual. A modalidade pré processual está descrita no artigo 126, cabeça, e tem como consequência a exclusão do processo. É anterior à Ação Socioeducativa. Já a modalidade processual, prevista no parágrafo único do artigo 126, o processo judicial já foi iniciado. A consequência da Remissão, neste momento, é a suspensão ou extinção da demanda. O ponto fulcral desta medida é a possibilidade da utilização da Remição cumulada com qualquer Medida de Proteção ou Medida Socioeducativa. A vedação de cumulação se dá, tão somente, pelo acumulo da Remissão e medida de Restrição de Liberdade (semiliberdade ou internação). O Juiz tem um papel fundamental nesta etapa. Ele poderá homologar a medida ou as medidas, se o caso, em desfavor do adolescente. Não homologando: encaminhará ao Procurador Geral de Justiça e este oferecerá a Representação; encaminhará a outro membro do MP para fazê-lo; ou, ainda, pode ratificar a homologação que, somente neste último caso, o Juiz estará obrigado a homologar. Art. 181. Promovido o arquivamento dos autos ou concedida a remissão pelo representante do Ministério Público, mediante termo fundamentado, que conterá o resumo dos fatos, os autos serão conclusos à autoridade judiciária para homologação. § 1º Homologado o arquivamento ou a remissão, a autoridade judiciária determinará, conforme o caso, o cumprimento da medida. § 2º Discordando, a autoridade judiciária fará remessa dos autos ao Procurador-Geral de Justiça, mediante despacho fundamentado, e este oferecerá representação, designará outro membro do Ministério Público para apresentá-la, ou ratificará o arquivamento ou a remissão, que só então estará a autoridade judiciária obrigada a homologar. Fase Judicial Adentrando ao último ponto do presente estudo: a fase Judicial. Subdivide-se, essa fase, em: Representação, Audiência de Apresentação, Produção de Provas, Alegações Finais, Sentença e Recursos. Vamos tratar, de forma não exaustiva, claro, de todos os pontos acima elencados. A Representação, tal como alude o artigo 41 do Código de Processo Penal quanto aos requisitos da Denúncia, deve passar por um Juízo de admissibilidade. Isso é dizer, deve suprir requisitos. Logo, o Juiz competente deve rejeitar a peça inicial acusatória se: Não estiver de acordo com os requisitos do artigo 182, parágrafo primeiro, do ECA; For oferecida contra ato infracional praticado por criança; O autor do ato infracional possuir 21 anos completos, artigo 2º, parágrafo único, combinado com o artigo 121, parágrafo 5º do ECA; Na data do fato o agente era imputável, artigo 104, parágrafo único, ECA; e A conduta manifestamente não constituir ato infracional. Ou seja, não estando configurado os fatores acima trazidos, a Representação deverá ser recebida pelo Magistrado. Tão logo receber a Exordial, deverá analisar o requerimento – desde que esteja presente – de internação provisória. Observação crucial para esta internação antes da Sentença: a transferência para o sistema adequado para o cumprimento da internação será realizada imediatamente. Ocorrendo qualquer impossibilidade, o adolescente aguardará pelo prazo de cinco dias na delegacia, prazo improrrogável, e, claro, separado dos adultos. Superado a análise da internação provisória, os pais do adolescente serão notificados em conjunto com o próprio adolescente para a audiência de apresentação, acompanhados de advogado. Após essa análise, iniciará a fase de audiências – apresentação e continuação – com o escopo de instruir o feito para decisão. Observado, portanto, os aspectos legais, os quais, não serão abordados pormenorizadamente neste estudo, talvez em outro com o intuito de aclarar o rito do ECA em audiência. Percebe-se, no presente momento, o ponto final do artigo elaborado com o escopo de apresentar, de forma singela, os aspectos do Ato Infracional praticados tanto por criança quanto por adolescente. Existem inúmeras doutrinas capazes de esgotar a matéria aqui elucidada. Eu possuo como objetivo, tão somente, apresentar tal conteúdo pouco difundido de forma objetiva.
25 de agosto de 2023
SUMÁRIO Introdução 1 OS AUTOS DA EXECUÇÃO PENAL 1.1 Princípios 1.2 Guia de recolhimento. 1.3 Fixação da competência 1.4 Roteiro de penas 2 PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 2.1 Considerações iniciais 2.2 Regimes prisionais 2.3 Regime fechado 2.4 Regime semiaberto 2.5 Regime aberto 2.6 Aplicação concomitante de reclusão e detenção 2.7 Regime inicial dos crimes hediondos e equiparados 3 PROGRESSÃO DE REGIME 3.1 Progressão nos crimes comuns antes da lei 13.964 /19 3.2 Progressão nos crimes hediondos e equiparados antes da lei 13.464/07 e antes da lei 13.964 /19 3.4 Progressão especial 3.5 Progressão após a vigência da lei 13.964 /19 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS Referências Bibliográficas Introdução O presente artigo é um introito à Execução Penal, tema de fundamental importância à militância na advocacia criminal. Neste ínterim, ultrapassado estão as seguintes fases: investigação sob os aspectos do inquérito policial, bem como a verificação da culpa com o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, nos moldes do processo de conhecimento. Ao falarmos de execução penal, temos que vislumbrar o poder estatal em executar e administrar o cumprimento dessa pena imposta lá no processo de cognição. Nesta etapa, temos a possibilidade da progressão de regime, tema fulcral da matéria e, ainda, alguns incidentes que são de fundamental relevância ao advogado criminalista, por exemplo: anistia, graça, induto e comutacao de penas . Diante da enorme relevância da matéria, contudo, pela proposta deste estudo, qual seja, de apresentar um singelo e elementar conteúdo sobre o tema, a opção foi abordar os seguintes itens: os autos da execução penal com alguns princípios tidos como de maior relevância à matéria, a guia de recolhimento, competência e o roteiro de penas; as penas privativas de liberdade positivadas no nosso ordenamento jurídico e, consequentemente, os regimes prisionais e, por derradeiro, a progressão de regime dos crimes comuns e hediondos e suas etapas (antes da vigência das Leis 13.464/07 e 13.964 /2019 (o famoso pacote anticrime). Cada tema abordado, mesmo que de forma sucinta, é crucial à atuação da defesa técnica em todos os aspectos. Assim sendo, logo abaixo, a leitura terá como ponto de partida os autos da execução penal e, logo após, os princípios. Portanto, desejamos uma boa leitura! 1 OS AUTOS DA EXECUÇÃO PENAL O processo de execução é um único processo, mesmo nos casos em que existem diversos apensos (tratando-se dos processos físicos). Ele é dividido, para facilitação, em diversos assuntos, tais assuntos dizem respeito aos denominados incidentes. Por exemplo, no momento em que o sentenciado pugna pela progressão de regime prisional, forma-se um apenso que terá como objetivo, exclusivamente, o trâmite dessa questão. 1.1 Princípios A execução penal é, assim como todos os demais remos do Direito, norteada por importantíssimos princípios, dentre os quais, mencionarei os mais importantes conforme a minha interpretação. Princípio da humanidade: encontra-se consagrado na Declaração Universal dos Direitos Humanos, bem como na Convenção Americana de Direitos Humanos e, ainda, no Brasil, tal princípio está positivado na Constituição Federal , mais precisamente na dignidade da pessoa humana. Em suma, tal princípio dispõe da vedação de penas cruéis, desumanas, veda a tortura, o confinamento solitário prolongado, com cela escura ou constantemente iluminada, etc. Princípio da legalidade: também com fundamento constitucional, pois não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal. Logo, com a utilização do termo pena, tem-se como obrigação interpretá-lo como sanção. Além da previsão constitucional, temos a redação do artigo 45 da LEP , com a seguinte previsão: “não haverá falta nem sanção disciplinar sem expressa e anterior previsão legal ou regulamentar”. Princípio da individualização da pena: A CF/88 , art. 5º , estipula que a lei regulará a individualização da pena. Tal princípio, de forma singela, evidentemente, enfatiza que as autoridades responsáveis pela execução penal possuem a obrigação de enxergar o preso como verdadeiro indivíduo, sem infligir prejuízo ao Condenado (costumeiramente nos casos de exames criminológicos), incluindo, na mesma esteira, a exclusão da apreciação de um determinado caso concreto (administrativa ou judicialmente) de maneira genérica, exemplo nítido nos casos de matéria disciplinar elevando o sofrimento de forma generalizada. Princípio da presunção de inocência: expressos nos seguintes diplomas legais, Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, Pacto São José da Costa Rica e, até mesmo na Carta Magna de 1988. O princípio, também conhecido como estado de inocência, além de outras hipóteses, é aplicável ao Sentenciado, principalmente nas hipóteses de sindicâncias decorrentes de falta disciplinar, no ínterim da execução da pena. E, por último, o princípio da razoável duração do processo: sabidamente, sobretudo aos juristas que lidam diretamente no âmbito da execução penal, é recorrente as críticas acerca da lentidão para a apreciação dos pleitos no âmbito da execução penal. Tal princípio encontra arrimo no Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos das Nações Unidas (1966), o qual assegura ao Preso o direito de julgamento em prazo razoável, ou a colocação em liberdade; também tem previsão no Pacto de São José da Costa Rica (CADH), ao estabelecer que toda pessoa presa, detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um Juiz para um julgamento em prazo razoável. 1.2 GUIA DE RECOLHIMENTO Com a autuação da guia de recolhimento, em conjunto com seus respectivos documentos, temos o início da execução. Após a confecção dessa guia, caso hajam demais execuções, todas serão apensadas a essa primeira execução. Essa guia é expedida pelo Juiz de piso, o qual deverá remetê-la ao Juízo da execução. Tal guia poderá ser provisória nos casos em que o sentenciado iniciar o cumprimento de pena antes de transitar em julgado sua sentença penal condenatória, ou, ainda, ser definitiva, no momento em que a sentença penal já estiver com a certidão de trânsito. Segue, para melhor compreensão, as preciosas palavras do NUCCI acerca da guia de recolhimento: Desse modo, a guia de recolhimento constitui não somente a petição inicial da execução penal, como a comunicação formal e detalhada à autoridade administrativa, responsável pela prisão do condenado, do teor da sentença (pena aplicada, regime, benefícios etc.). Deve conter todos os dados descritos nos incisos do art. 106, acompanhada das cópias das peças que instruíram o processo principal, de onde se originou a condenação. Os detalhes, em especial quanto às datas (fato, sentença, acórdão, trânsito em julgado etc.), são úteis para o cálculo da prescrição, uma das primeiras providências a ser tomada pelo juiz da execução penal. Não há sentido em se providenciar a execução de pena prescrita. (NUCCI, 2018, p. 152). 1.3 FIXAÇÃO DA COMPETÊNCIA Como elucidado acima, o início da execução da pena ocorre com a autuação da guia de recolhimento e compete ao juízo de piso – aquele que proferiu a sentença penal – expedir a referida guia. A competência do juízo das execuções sempre será o local no qual o Sentenciado estiver cumprindo pena e, modificará, também, sempre que se transferir de comarca. Em suma: no processo de execução a competência é deslocada sempre que o Sentenciado é transferido de comarca, diferentemente do que ocorre no processo de conhecimento. E mais, de nada importa se a Sentença tenha sido proferida pela Justiça Federal ou Estadual, estando o Condenado esteja cumprindo sua pena em um presídio Estadual, a competência para o processamento da execução penal será do Juiz de direito daquela comarca. Em termos práticos, determinado Sentenciado se encontra em cumprimento de pena no regime fechado na comarca de Avaré, mas atinge o lapso temporal e progride para o regime semiaberto e é transferido para a comarca de Porto Feliz e, por último, com o lapso temporal do regime aberto vai para a comarca da sua residência – por exemplo – São Bernardo do Campo. Nesse esquema, em cada comarca durante o cumprimento de pena havia um Juízo diverso competente. 1.4 ROTEIRO DE PENAS Inicialmente vamos supor a seguinte situação: determinado Sentenciado que não ostente nenhuma condenação (logo, nenhuma execução em curso) assim, após o trânsito em julgado da Sentença penal, será formado um apenso denominado de roteiro de penas. O cálculo de penas conterá a data do início do cumprimento dessa pena (frequentemente chamada por ICP), aqui, todas as frações de lapso temporal para a obtenção das progressões, do livramento, indulto , detração de penas, remissão, bem como o término de cumprimento de pena (este último, também, comumente chamado por TCP). Esse cálculo tem o seguinte sentido: demonstrar o momento em que será possível pugnar por cada instituto retromencionado, até mesmo o final da pena, o TCP. Diante das inúmeras possibilidades no processo de execução, o roteiro de penas sofrerá, consequentemente, diversas modificações. Isto é, pode ocorrer nesse trâmite processual uma unificação de pena, remição, comutação, ocorrendo, nesse sentindo, a modificação do término do cumprimento de pena. Outros apensos poderão iniciar e sempre dependerá do fato a ser pleiteado nessa fase processual. No transcorrer da pena, atinge-se o lapso temporal para o pleito da progressão de regime, logo, protocola-se tal pedido. Tão logo o cartório recebe a petição, o respectivo apenso será autuado. 2 PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 2.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS Cada tipo penal tem o denominado preceito secundário, e em alguns casos tal preceito positiva a pena privativa de liberdade. Como exemplo, o tipo penal incriminador positivado no artigo 121: matar alguém; e, como pena, traz a seguinte redação: reclusão de seis a vinte anos. O matar alguém do crime de homicídio é o preceito primário e a pena – 6 a vinte anos – por sua vez, é o preceito secundário. No ordenamento jurídico pátrio temos a previsão legal de três espécies de penas privativas de liberdade: reclusão, detenção e prisão simples. A reclusão destina-se a aos crimes tidos como grave. A detenção tem como escopo os crimes de menor gravidade, além dos crimes culposos. A prisão simples, por fim, é destinada exclusivamente aos casos de contravenção penal. 2.2 REGIMES PRISIONAIS Imperioso destacar, mesmo sendo matéria usualmente abordada em Direito Penal, pontos relevantes para uma melhor elucidação de acerca da execução Penal. No transcorrer do processo de execução da pena, o regime prisional poderá ser modificado em pontuais ocasiões, isto é, quando ocorrer a soma das penas, unificação de penas, ou na regressão ou progressão de regime. O Brasil prevê, em seu ordenamento jurídico criminal, o sistema progressivo de pena e, nesse sistema possuem três modalidades de pena: fechado, semiaberto e o aberto. Esses regimes é a manifestação do princípio da individualização da pena, pois conforme a quantidade da pena imposta, conforme as circunstâncias judiciais de cada Sentenciado e a depender de ser reincidente, ou não, o agente poderá iniciar o cumprimento de sua pena em um dos regimes existentes. Compete ao Juiz de piso (primeiro grau) estabelecer na sentença condenatória o regime inicial de cumprimento da pena imposta. Melhor elucidando o retro apresentado, o destaque da brilhante lição de Luiz Regis Prado será de grande valia, veja: Preceitua o atual Código Penal (art. 33, caput) que a pena de reclusão deverá ser cumprida em regime fechado, semiaberto ou aberto; a pena de detenção, porém, será executada em regime semiaberto ou aberto – admitindo-se, excepcionalmente, a regressão para o regime fechado. São, portanto, três os regimes de cumprimento das penas privativas de liberdade, a saber: a) regime fechado: neste a pena privativa de liberdade será executada em estabelecimento de segurança máxima ou média (art. 33, § 1 .0, a); b) regime semiaberto: admite a execução da pena em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar (art. 33, § l .º, b) ; c) regime aberto: o cumprimento da pena dá-se em casa de albergado ou estabelecimento adequado (art. 33, § 1º, e). Desse modo, tem-se que no regime fechado o cumprimento da pena é feito em penitenciária, construída – quando se tratar de condenados homens – em local afastado do centro urbano, a distância que não restrinja a visitação (arts. 87 e 90 , LEP ). “A União Federal, os Estados, o Distrito Federal e os Territórios poderão construir Penitenciárias destinadas, exclusivamente, aos presos provisórios e condenados que estejam em regime fechado, sujeitos ao regime disciplinar diferenciado, nos termos do artigo 52 desta Lei” (art. 87 , parágrafo único , LEP ). (PRADO, 2014, p. 462). 2.3 REGIME FECHADO Os Sentenciados que forem condenados pela prática de crimes puníveis com reclusão, e a pena cominada for maior que oito anos, iniciarão o cumprimento dessa pena no regime fechado. Matéria trazida pena redação do artigo 33 , parágrafo segundo, alínea a, do Código Penal . Os crimes puníveis com detenção, em detrimento dos puníveis com reclusão, em hipótese alguma terão o início do cumprimento no regime fechado, mesmo que tenha o reconhecimento de reincidência. Contudo, temos os casos em que há a regressão de regime, daí a jurisprudência entende como cabível. O mesmo artigo acima exposto – 33 , CP – no parágrafo primeiro, alínea a, determina que o cumprimento será em estabelecimento de segurança média ou máxima. Nesse mesmo regime, logo no início, o Sentenciado faz o exame criminológico o qual terá o escopo de classificar e individualizar a pena de cada Sentenciado. Sobre o trabalho: permitido no período diurno e o isolamento no repouso noturno; o trabalho é comum dentro da unidade prisional, levando em conta a qualificação pregressa de cada indivíduo; e, por fim, há a possibilidade do trabalho externo, desde que seja realizado em serviços ou obras públicas. 2.4 REGIME SEMIABERTO Diferentemente de todo o exposto acerca do regime acima (fechado), o regime semiaberto determina que os condenados por crimes puníveis com reclusão ou detenção, não reincidentes, com pena superior a quatro e que não exceda a oito anos, iniciarão sua pena nesse regime (semiaberto), redação do artigo 33, parágrafo segundo, alínea b. Para o ingresso nesse regime, o Código Penal exige a não reincidência como requisito. Além disso, deve ser observado as circunstâncias judiciais do artigo 59 , CP . As circunstâncias judiciais deverão ser ponderadas pelo magistrado, tidas como circunstâncias que envolvem o crime nos aspectos objetivos e subjetivos, tão logo que estiver na dosimetria da pena. Nesses ditames acima elencado é que o ordenamento jurídico brasileiro – mais precisamente o Direito Penal – dá condição legal para que o Sentenciado inicie o cumprimento de sua pena no regime inicial fechado, mesmo que sua pena esteja abaixo dos oito anos. Essa possibilidade reside, desde que o agente seja reincidente e as circunstâncias judiciais sejam favoráveis para essa pena. 2.5 REGIME ABERTO Por fim o regime aberto. Nesse regime, o Sentenciado que for condenado pela prática de crime punível com reclusão ou detenção simples, não reincidente e desde que a pena cominada seja igual ou inferior a quatro anos. Conteúdo exposto pela redação do artigo 33 , parágrafo segundo, alínea c do Código Penal . O cumprimento da pena no regime aberto será em casa e albergado ou em estabelecimento penal adequado à pena, CP , art. 33 , parágrafo primeiro, alínea c). Nesse regime, por obvio, exige-se do Sentenciado disciplina e responsabilidade, o qual deverá – sem vigilância estatal – trabalhar, estudar, ou exercer alguma atividade autorizada e, ainda, manter-se recolhido à noite e nos dias em que estiver de folga. Imperioso o destaque do artigo 114 da Lei de Execução Penal , pois tal artigo determina alguns critérios, quais sejam: estar, o Sentenciado, trabalhando ou que comprove a possibilidade de trabalhar tão logo que iniciar o regime e, ainda, demonstrar conforme seus antecedentes ou pelos exames realizados que terá comprometimento, disciplina e responsabilidade diante do novo regime. Aos maiores de setenta anos o Juiz poderá estabelecer condições extraordinárias (especiais) para que seja possível a concessão do regime aberto. Vejamos: permanência no local estabelecido, no ínterim do repouso e nos dias de folga; ir e voltar do trabalho nos horários fixados; não sair da comarca na qual resida sem prévia autorização judicial; e, por fim, comparecer a Juízo para informar e justificar – o famoso período de prova – sempre que solicitado. Ponto importantíssimo no que diz respeito às condições especiais no que tange ao regime do semiaberto. O Magistrado jamais poderá impor alguma prestação de serviço à comunidade, a perda de bens e valores, limitar o fim de semana, interditar temporariamente de direito. Tudo isso, caso ocorra, é provável que ocorra a denominada por excesso de execução. Corroborando com o supramencionado, temos a redação da Súmula de número 493 do Superior Tribunal de justiça: “É inadmissível a fixação de pena substitutiva (art. 44 do CP ) como condição especial ao regime aberto”. 2.6 APLICAÇÃO CONCOMITANTE DE RECLUSÃO E DETENÇÃO Pouco acima, abordamos a impossibilidade de aplicação do regime inicial fechado aos crimes punidos com detenção. Ocorre que é perfeitamente possível que o Sentenciado esteja respondendo processualmente por dois crimes, ou mais, concomitantemente, um punível com reclusão e outro com detenção. No caso acima, dois processos tramitando no mesmo ínterim, sobrevindo duas condenações – uma de reclusão e outra de detenção – e, ao serem executadas, será da seguinte forma: a pena mais grave será iniciada primeiramente. Isso é o que aduz o Código Penal , artigo 69 , caput, parte final: Art. 69 – Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplicam-se cumulativamente as penas privativas de liberdade em que haja incorrido. No caso de aplicação cumulativa de penas de reclusão e de detenção, executa-se primeiro aquela. 2.7 REGIME INICIAL DOS CRIMES HEDIONDOS E EQUIPARADOS A Lei 8.072 /1990 no que consta do artigo 2º , parágrafo primeiro, tinha, outrora, a previsão de que o cumprimento da pena, nos casos de hediondez, deveria ser integralmente no regime fechado. Contudo, o Pleno do Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade deste dispositivo legal. Diga-se de passagem, acertadamente! Com essa decisão sobreveio a nova redação do Art. 2º , parágrafo primeiro, da Lei de Crimes Hediondos . Essa redação passa a prever que a pena dos crimes hediondos e equiparados (tráfico tortura e terrorismo) deverá ser inicialmente – não mais integralmente – fechado. E, mesmo com essa nova redação de cumprir inicialmente no fechado, o STF declarou a inconstitucionalidade do cumprimento da pena dos crimes hediondos e equiparados, obrigatoriamente, no regime fechado. Nesse diapasão, a aplicação da pena, já dosada, com a pena incialmente no fechado, deverá obrigatoriamente ser fundamentada sob pena de nulidade. Tudo isso em decorrência da ofensa ao princípio da individualização da pena. 3 progressão de regime Adentramos no último tema do presente trabalho, e nesta oportunidade abordaremos o sistema progressivo adotado no regime jurídico pátrio (sistema progressivo). Tal regime impõe alguns requisitos, por exemplo, na hipótese de determinado sentenciado não cumprir as regras do estabelecimento prisional ou, ainda, caso sobrevenha nova condenação, bem provável que tenha um regressão de regime em seu desfavor (ir do aberto ao semiaberto, ou pior, ir do semiaberto ao fechado). Logo, diante do exposto, pode dizer que a progressão é um sistema de direito subjetivo o qual necessita de certos requisitos devidamente preenchidos – requisitos, estes, legais – os quais dão a possibilidade de migrar de um regime mais gravoso para um mais benéfico. É um sistema fracionado: fechado, semiaberto e aberto e, por fim, como última etapa, temos o denominado livramento condicional. Válido mencionar, agora, que o livramento não é um regime prisional, pois como dito há pouco, temos no ordenamento jurídico pátrio apenas três regimes, reitero: fechado, semiaberto e aberto. Outro importantíssimo ponto para tecermos comentários é a impossibilidade da progressão per saltum. No Brasil existe a possibilidade jurídica da regressão por salto, o contrário – progressão – não. À luz do acima escrito, temos a seguinte possibilidade: caso algum Sentenciado esteja em pleno cumprimento do regime fechado, essa execução não poderá ter o regime semiaberto ignorado e ter como fim o cumprimento de pena nos moldes do regime aberto, ou seja, é vedado ir do regime fechado ao aberto. Obrigatoriamente, percebam, a execução deverá ser cumprida no regime sequente. E mais, o contrário é diferente: caso o Sentenciado esteja cumprindo o regime aberto e vier a praticar algum tipo de falta grave, é possível que volte diretamente ao regime fechado – exatamente isso – a regressão por salto, aqui, na regressão, é possível. Anteriormente a vedação ao instituto aqui tratado estava implicitamente contida na Lei de Execução Penal , artigo 112 , caput. O mesmo artigo, no entanto, em 2019 e com a nova redação trazida pela Lei 13.964 , foi alterado pela seguinte redação: Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos… Nessa nova redação não há mais a previsão que exigia que o Sentenciado que atingisse o lapso temporal para a progressão deveria cumprir, com a devida progressão, o regime seguinte. Isso é dizer que, nos ditames da LEP , é possível que se realize o salto do regime fechado ao aberto. Trata-se de uma novatio legis in mellius, logo, deve retroagir para o benefício de todos que estejam em cumprimento de pena. Nem tudo foram flores, pois, a mesma Lei que permitiu a progressão por salto, também, recrudesceu o regramento para a progressão de regime prisional. Todavia, essa norma mais recrudescida somente será aplicável aos crimes cometidos após a vigência dessa norma: 23 de janeiro de 2019. 3.1 progressão nos crimes comuns antes da lei 13.964/19 Crimes comuns, são os crimes que não estejam listados no rol dos crimes hediondos (Lei 8.072 de 1990) e os equiparados: tráfico, terrorismo e tortura. Crimes comuns serão o cerne desse momento de estudo. A vigência do Pacote Anticrime – Lei 13.964 /2019 – modificou o requisito objetivo. Antes, a Lei de Execução Penal trazia a seguinte forma: Cumprimento de 1/6 da pena, somado ao bom comportamento (requisito subjetivo). O bom comportamento (requisito subjetivo) é o comportamento carcerário do Sentenciado, esse comportamento vem reduzido a termo no boletim informativo e no atestado de conduta carcerária. Documentos, estes, emitidos pela unidade prisional. Havia, outrossim, a possibilidade de exame criminológico e do parecer da comissão técnica de classificação ao Sentenciado que pleiteava pela progressão. Contudo, os Tribunais Superiores pacificaram o entendimento de que, mesmo ausente da redação legal, pode ser realizado desde que seja devidamente fundamentado. Nesse sentido, temos a redação da Súmula Vinculante de número 26: Para efeito de progressão de regime no cumprimento de pena por crime hediondo, ou equiparado, o juízo da execução observará a inconstitucionalidade do art. 2º da Lei 8.072 , de 25 de julho de 1990, sem prejuízo de avaliar se o condenado preenche, ou não, os requisitos objetivos e subjetivos do benefício, podendo determinar, para tal fim, de modo fundamentado, a realização de exame criminológico. 3.2 progressão nos crimes hediondos e equiparados antes da lei 13.464/07 e antes da lei 13.964/19 Agora adentraremos aos crimes hediondos, aqueles listados na redação da lei 8.072 de 1990 e os equiparados – tráfico, tortura e terrorismo – diferentemente do supramencionado. Num primeiro momento abordaremos os crimes hediondos durante a previsão na qual os condenados pela prática desses crimes deveriam cumprir pena integralmente no fechado. Isso é dizer que não haveria possibilidade de progressão. Nada obstante, o Supremo Tribunal Federal julgou o HC de número 82.959/SP e, por maioria, foi declarado inconstitucional a proibição da progressão de regime aos crimes descritos na lei 8.072 /90. Isso decorreu ante a afronta ao princípio da individualização da pena. A consequência dessa declaração de inconstitucionalidade foi que todos os condenados pelos crimes dessa natureza adquiriram o direito de progredir de regime prisional, conforme o aduzido no artigo 112 da Lei de Execução Penal . Para corroborar com o acima exposto, sobreveio a redação da Súmula 471 do Superior Tribunal de Justiça. SÚMULA N. 471: Os condenados por crimes hediondos ou assemelhados cometidos antes da vigência da Lei n. 11.464 /2007 sujeitam-se ao disposto no art. 112 da Lei n. 7.210 /1984 ( Lei de Execução Penal ) para a progressão de regime prisional. Porém, o legislador, diante da Súmula acima, previu uma nova redação legal com o aumento do lapso temporal para a progressão desses crimes. Previamente, o lapso seria de 1/6 do cumprimento de pena e, após a vigência da Lei 11.464 /07 – responsável pela nova redação legal – o lapso passou para 2/5 da pena ao condenado primário e, aos reincidentes em crimes hediondos, 3/5 de cumprimento de pena para a progressão. Essa nova redação não é válida, por respeito ao princípio da irretroatividade da Lei penal, aos casos em que a condenação sobreveio anteriormente à vigência do texto legal que recrudesceu o lapso de 1/6 para 2/5 e 3/5. Assim sendo, aos Sentenciados com sentenças transitadas em julgado anteriores à norma acima, mesmo sendo por crime hediondo, o lapso para a progressão será tão somente de 1/6. Ainda, tal qual no item 3.1, o requisito subjetivo é exigido, qual seja: bom comportamento carcerário. Assim sendo, todo o elucidado para os crimes comuns, sobre comportamento, é aplicado aos casos que envolvam os crimes hediondos e equiparados. 3.4 progressão especial Há, ainda, a chamada progressão especial, trazida pela redação da Lei de número 13 /769 de 2018. É uma lei penal mais benéfica e, consequentemente, deve ser aplicada aos crimes praticados antes de sua vigência. Nessa novatio legis, há alguns requisitos para a obtenção dessa progressão, a saber: mulheres gestantes ou que forem mãe ou responsáveis por crianças ou pessoas com deficiência; não terem cometido crime com violência ou grave ameaça a pessoa; não terem cometido o crime contra seu filho ou dependente; terem cumprido, ao menos, 1/8 da pena no regime anterior; serem primária e terem bom comportamento carcerário, tudo comprovado pelo estabelecimento prisional; e por fim, não estarem integradas às organizações criminosas. Também é aplicada aos crimes hediondos e equiparados essa progressão especial, tendo em vista que a redação desse dispositivo não traz nenhum óbice tampouco distinguiu os crimes comuns dos hediondos e equiparados. 3.5 progressão após a vigência da lei 13.964 /19 Agora, enfim, abordaremos o lapso temporal para a progressão de regime prisional após a vigência do pacote anticrime. Outrora era estipulado, para atingir o tempo para pleitear a progressão, o lapso contabilizado por frações. Hoje, com a nova Lei, temos no ordenamento jurídico diversas e novas frações. Como dito inicialmente, o requisito objetivo foi modificado, vejamos a redação do artigo 112 da Lei de Execução Penal . Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos: I – 16% (dezesseis por cento) da pena, se o apenado for primário e o crime tiver sido cometido sem violência à pessoa ou grave ameaça; II – 20% (vinte por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime cometido sem violência à pessoa ou grave ameaça; III – 25% (vinte e cinco por cento) da pena, se o apenado for primário e o crime tiver sido cometido com violência à pessoa ou grave ameaça; IV – 30% (trinta por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime cometido com violência à pessoa ou grave ameaça; V – 40% (quarenta por cento) da pena, se o apenado for condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, se for primário; VI – 50% (cinquenta por cento) da pena, se o apenado for: condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, com resultado morte, se for primário, vedado o livramento condicional; condenado por exercer o comando, individual ou coletivo, de organização criminosa estruturada para a prática de crime hediondo ou equiparado; ou condenado pela prática do crime de constituição de milícia privada; VII – 60% (sessenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente na prática de crime hediondo ou equiparado; VIII – 70% (setenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime hediondo ou equiparado com resultado morte, vedado o livramento condicional. § 1º Em todos os casos, o apenado só terá direito à progressão de regime se ostentar boa conduta carcerária, comprovada pelo diretor do estabelecimento, respeitadas as normas que vedam a progressão. § 2º A decisão do juiz que determinar a progressão de regime será sempre motivada e precedida de manifestação do Ministério Público e do defensor, procedimento que também será adotado na concessão de livramento condicional, indulto e comutacao de penas , respeitados os prazos previstos nas normas vigentes. § 3º No caso de mulher gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência, os requisitos para progressão de regime são, cumulativamente: I – não ter cometido crime com violência ou grave ameaça a pessoa; II – não ter cometido o crime contra seu filho ou dependente; III – ter cumprido ao menos 1/8 (um oitavo) da pena no regime anterior; IV – ser primária e ter bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento; V – não ter integrado organização criminosa. § 4º O cometimento de novo crime doloso ou falta grave implicará a revogação do benefício previsto no § 3º deste artigo. § 5º Não se considera hediondo ou equiparado, para os fins deste artigo, o crime de tráfico de drogas previsto no § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343 , de 23 de agosto de 2006. § 6º O cometimento de falta grave durante a execução da pena privativa de liberdade interrompe o prazo para a obtenção da progressão no regime de cumprimento da pena, caso em que o reinício da contagem do requisito objetivo terá como base a pena remanescente. Imperiosos destaques atinentes ao retro exposto, os incisos que tratam especificamente da reincidência, não de quê se olvidar que a reincidência deverá ser específica. A reincidência simples, no entanto, terá um percentual menor em detrimento da progressão para o reincidente específico. 4 Considerações Finais Como proposto, aduzimos alguns temas de forma mais superficial e, outros, mais detidamente. a execução penal, bem como suas modificações trazidas pela vigência do pacote anticrime e a progressão de regime prisional, é um tema exponencial à ciência penal, por conseguinte, foi o tema deveras estudado pelo autor porquanto é inimaginável o operador do direito (principalmente a defesa) negligenciar tal matéria e possuir, concomitantemente, um desemprenho satisfatório em seu trabalho Referências Bibliográficas MARCHI JÚNIOR, Antônio de Padova; PINTO, Felipe Martins. Execução Penal, constatações, críticas e alternativas. 1ª ed. Cutitiba, Juruá, 2008. MIRANDA, Rafael de Souza. Execução Penal, teoria e prática. 2ª ed. Bahia. Juspodivm, 2020. NUCCI, Guilherme de Souza. Curso de Execução Penal. 1ª ed. Rio de Janeiro. Gen Forense, 2018. PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro. 13ª ed. São Paulo. Revista dos Tribunais, 2014. ROIG, Rodrigo Duque Estrada. Execução Penal teoria crítica. 4ª ed. São Paulo. Saraiva, 2018.